domingo, 13 de abril de 2014



Pintura com bom-bril e colagem de uma foto do meu olho
 Liz Rabello

SEUS OLHOS!

Teus lábios não se abriam
Senão para me beijar!
Nunca foste de sorrir!
Eras sério demais...
Mas eu lia teus olhos
E tinhas a capacidade
Mágica de sorrir por eles!

Não por acaso,
Aquele brilho
que eu em ti amava
E te sabia meu!
E te sabia alegre!
Nos olhos que só
pra mim Sorria!

Caso a tristeza
Tomasse conta
Deste brilho
Eu o sabia ler,
Como soube na tarde
Em que fostes embora
Da minha história!

Na minha memória
Nem seus lábios se movem
Num beijo tardio
Nem seus olhos piscam
Num sorriso infantil!
Apenas adormeces no sono

Eterno!

Liz Rabello

sábado, 12 de abril de 2014




TÃO LONGE TÃO PERTO

Como o reflexo da água 
Vejo-te na transparência 
Das miragens eternas! 
Vejo-te na imensidão do mar 
No buraco negro do infinito 
No meio das nuvens a se dissipar
Vejo-te no clarão do luar 
No sol brilhando, orvalho secando 
No vento a dispersar manhãs geladas! 
Vejo-te assim tão distante, além mar! 
Longe demais o coração a clamar! 
Sentimentos quentes, sussurros a escutar! 
Vejo-te e sei que não são apenas miragens 
Angústias de quem ama em solidão 
Tão longe e tão perto do coração a saltar!

(Liz Rabello, in MIL PEDAÇOS, 2012, Beco dos Poetas, SP)

sexta-feira, 11 de abril de 2014


DOCE VENENO

Tu és meu doce veneno
Taça de cristal estilhaçada!
Eu te bebo, não fico saciada!
Sede que não se aplaca,
delícia pura, desejo insano,
vontade delituosa!

Os anjos me abandonam...
Nas mãos de loucos diabinhos
meu inferno em fogo queima!
Cometo todos os pecados
pra sentir prazer contigo!

Liz Rabello

quinta-feira, 10 de abril de 2014



PINGOS DE ESTRELAS

Da palma de minha mão
Caem pingos de estrelas
Ondas deslizam na água
O vento as mastiga 
Sinto-me triturada por ele
Fustiga meus sonhos
Rouba-me o brilho
Perco o prata da lua
Nuvens são pingos agora
Tempestade lá fora
Tristeza nas mãos!
Solidão outra vez!

(Liz Rabello, In MIL PEDAÇOS, Beco dos Poetas, 2012)


TEU AMOR É PERFUME NO AR

Sinto teu amor como um perfume no ar!
Inalo, seguro dentro dos meus pulmões,
reabasteço meu ser,
faço circular em minhas veias...
Até o centro do meu coração!
Quando devolvo ao vento... Peço...
Leve ao meu amor o que senti...
Porque foi muito bom!

Liz Rabello / 2012
Pintura de Leonid Afremov

VOLTAR PARA O NADA

Quis tanto ser amada e desejada
Pelo homem que eu amei
Que me expus demais
E me perdi nos meus limites
Fiz fotos sensuais, as publiquei!
E deletei! Não assumi...
No meu íntimo mais íntimo
Sou sensível, profunda, intensa,
Mas discreta e tímida!
Ousei pra superar barreiras
Romper fronteiras!
Ir adiante numa relação
Mais que fracassada!
Desejar ser amada
Quando na verdade
Nem posso ser tocada...
Voltar no tempo...
Ser eu mesma...
Sem pintura,
Sem retoques...
Sem mais nada...
Voltar para o Nada
Onde é o meu lugar!
Só!

Liz Rabello / 2012

quarta-feira, 9 de abril de 2014





Um por-do-sol.
Um barco a navegar a esmo na imensidão do mar!
Um único ser humano impotente diante de tanta beleza
Me faz pensar que não adianta a gente querer tanto
 os outros a nossa volta, 
porque sempre haverá este instante
 de encontro do nosso eu com o infinito!

Hoje fiquei presa no elevador. As luzes se apagaram. Escuridão total! Não senti medo algum e fiquei feliz por isto. Acredito que a maior vitória de um ser humano é conseguir ficar só, alienado dos outros, em total confronto com sua essência e gostar do que vê! Viver a vida intensamente, de tal forma que possas olhar o outro dentro do olho é fácil. Difícil é olhar para dentro de si mesmo, porque somente nós sabemos como é nosso mundo interior!

(Liz Rabello / 2014)


ENGOLINDO PALAVRAS

Vou cuspir em versos palavras que engoli
Desejos reprimidos que escondi
Frases feitas que roubei
Cenas da vida que inventei
Porque não as vivi!

Vou empanar em versos
Sonhos que fiz reais
Mistérios que desvendei
Em noites mal dormidas
Com corações que troquei!

Vou engolir em versos
O que não posso ter
O que quero e não vou esquecer
O que reclamo e não vou tecer
O que busco e jamais encontrei!

(Liz Rabello / 2012)

domingo, 6 de abril de 2014



PERCEPÇÃO

Há um lugar pra mim?
Onde eu possa ficar?
Estar segura?
Ser acolhida?
Permanecer com calma?
Viver em paz?
Sentir a vida me levar?

Aqui minha sensação
É de que não estou
Não tem lugar pra mim
Não há espaço
Esbarro nas partes
Transbordo nas beiras
Me ausento do meio!

Qual a percepção do por quê?

(Liz Rabello / 2012)

sábado, 5 de abril de 2014


FIDELIDADE, UM DIAMANTE QUE NÃO PODE PERDER O BRILHO!
PALAVRA MÁGICA

Real é o nosso pensamento
Sonhos a nortear este sentir
Sou o que tenho dentro da mente
E não o que tu consegues mentir
Sobre mim ou sobre ti!

Real é a faísca do instante
Aquilo que se projeta de mim
Para um vazio fora de ti
E não o que tu consegues captar
Sobre ti ou sobre mim

Diante da incerteza

O que é o mundo real
Ou o que é aparência
Fica apenas uma certeza
O que cabe dentro de mim

Tuas verdades não são as minhas

Minhas mentiras não são as tuas
Só que há uma ponte entre elas
Do meu EU para o SEU
A palavra mágica: AMOR



Sempre soube de minhas origens étnicas... Portuguesa, africana, por parte do meu pai e literalmente italiana por parte de minha mãe. Como sempre moramos junto ou pertinho demais dos meus avós maternos, não poderia deixar de ser: a macorranada, na quinta e no domingo. O nhoque feito em casa. As pizzas também, com grandes rodelas de tomate. Minha cor clarinha, que com facilidade avermelhava ao sol, cabelos soltos encaracolados e modos bem abertos, bem marcantes, gesticulantes. Mania italiana de falar alto, com as mãos e o corpo todo. Olhos verdes, clarinhos como os de meu nono, jamais negaram minhas origens marcantes deste povo, que aqui veio para trabalhar.
Meu avô era um homem bonito demais. Minha avó, muito ciumenta! Não eram um casal perfeito do meu ponto de vista infantil. Brigavam muito. Sempre por dinheiro! Lembro-me até hoje de como foi alegre o final de uma destas brigas em que vovô jogou em cima dela um montão de moedas e notas... Estas voando ao vento e eu e meus primos, correndo pelo quintal para resgatá-las e entregá-las à vovó triunfante! Finalmente conseguira abrir o colchão, onde vovô escondia seu tesouro, guardado e colhido de seu trabalho, de sol a sol!
Constantemente recebíamos visitas. Primos de minha mãe. Crianças lindas, bem arrumadas, filhos e netos dos irmãos de vovó. Eles eram ricos. Nós extremamente pobres. Não entendia o porquê daquela velha história de que o nono deixara toda sua fortuna aos irmãos de vovó e nada, absolutamente nada, para ela. E vovô repetia: “Dos Bonellos não quero nada!” E vovó retrucava: “É meu direito, sou filha tal e qual”.
Descobri que tudo
Pode ser muito lindo
Ou imensamente triste!
Palavras soltas
Perdidas nas lembranças
Apagadas da memória
Podem ser reinventadas
Costuradas com linhas
e agulhas da imaginação!



Quando a Globo, décadas atrás lançou uma novela, cujo tema foi imigração italiana para o Brasil, alguns pontos se iluminaram. Não sei bem distinguir qual é a verdade, nem mesmo sei o que é ficção daquilo que consigo costurar em minhas memórias. Vovó e sua família mais abastada aqui chegou para incrementar a industrialização iniciante. Como vieram com dinheiro, logo conseguiram um local no Bom Retiro para começar a indústria de cabos de guarda-chuva de chifres de bois. Já vovô veio com contrato assinado para trabalhar na lavoura, afim de substituir a mão de obra escrava negra, que se dissipava com o fim da escravidão. Ele, misturou-se aos já nativos negros. Aqui chegou apenas para “embranquecer” a população pobre brasileira. Em comum, meu avô e minha avó: apenas a nacionalidade, a idade, a loucura do amor da juventude e a paixão. Conheceram-se no navio. Amaram-se. Ela, quinze anos de idade apenas. Quando os nonos souberam, é claro, não permitiram o namoro. Mas nada os separou. Meu avô fugiu do contrato, não foi para o interior, como sugeria a primeira proposta, perambulou pelas ruas do Bom Retiro, sempre sondando o amor que sentia pela amada. Fugiram. Minha avó foi deserdada. Meu avô orgulhoso, só lhe deu aquilo que podia prometer: Amor, pobreza, honra e um montão de filhos. Dez! Casaram-se após o nascimento do meu tio mais velho. Na agonia da pobreza e da busca por melhores condições, conseguiram construir a casa própria, casar os filhos e crescer a família com netos e bisnetos.
Muitos anos se passaram, desde o início daquele amor eterno! Vovô ficou doente quando morreu de tuberculose o filho mais velho, aos vinte e quatro anos, após o Tio Mário, solteiro, quinze anos de idade, sofrer um ataque cardíaco e também vir a falecer. Vovô tremia pela casa, derrubando talheres e fazendo barulhinhos ao tomar a sopa com a colher. Aquilo irritava a todos, menos a ela, que continuou a cuidar dele até o último instante., amando-o com fidelidade absoluta. Depois que ele teve o derrame, que o imobilizou para sempre numa cama, sem poder locomover-se, minha tia ajudava a mãe a cuidar do meu avô: eram banhos, comida na boca, viradas na cama para não criar chagas pelo corpo... Um trabalho sem fim! Vovó já bem idosa, não fugia de suas obrigações de esposa, até aquela última semana que a morte veio buscá-lo. Ele entrou em estado de coma entremeado a lucidez periódica. Nestes momentos, ou naqueles, não o sei, só perguntava por uma tal de Maria e por um filho que tivera com ela. Vovó ouviu calada e calada afastou-se para nunca mais voltar ao lado dele. Não chorou sua desilusão, nem sua morte e calada ficou até o fim de seus dias.
(Liz Rabello - In INTERVALOS, Beco dos Poetas, 2013 - SP)

sexta-feira, 4 de abril de 2014



QUANDO 

Quando tu me beijas 
Pétalas de flores desabam 
tempestades de cores! 
Rosas multicoloridas 
perfumam e alegram 
meu coração de amor! 

Quando tu me olhas
reflexos de luz 
fustigam minha paz! 
Músicas suaves 
canduras de desejos 
embalam ternos sonhos! 

Quando tu me tocas 
mãos perfeitas me encantam 
primaveras de alegrias 
joaninhas pintadinhas 
brancas, pretas, vermelhinhas 
jogam poesia em meu sentir! 

Quando tu partes 
(E sempre vais) 
levas meu mundo 
meu ser inteira! 
Nada fica a sussurrar 
senão este desejo 
de te veres voltar! 


(Liz Rabello)


SEM RAZÕES

Liberte teu coração
Ao sabor do vento
Deixe-o falar mais alto
Do que o pensamento
Fluir tempestades de desejos!
Juízos pré moldados? Não sei não...

Coração tem cem razões
Sempre a te guiar
Sem razão nenhuma a nortear.
Se a consciência comandar
Tramas do destino amordaçar
Permitas a teu coração gritar
que queres voar e amar!

(Liz Rabello - in INTERVALOS, ARMADILHAS DO DESTINO, Beco dos Poetas, 2013, SP)



DAS JANELAS DO PASSADO

“Espelho, espelho meu, quem é mais feia do que Eu?” Não, nunca me achei feia, nem mesmo bela. Qual a visão de mim mesma? Por mim? Na ausência de espelhos, numa infância muito pobre, como conseguia me saber? Penso que sempre me vi pelos olhos úmidos de emoção de meu pai. Era puro amor, encantamento! A mais bela imagem refletida. Por suas palavras doces e elogios tinha uma imagem de mim muito agradável e segura. Sentia-me com pés no chão, mas brilhante como a mais bela estrela. Ele se mostrava “satisfeito” por eu existir. Lembro-me de uma manhã de domingo. Desenhava, como de hábito, na mesa da cozinha, com meus lápis coloridos de dez centímetros cada, apenas meia dúzia, que eu cuidadosamente usava. Meus pais não podiam comprar outros. Uma visita, um amigo de meu pai. Ele me apresentou ao outro de uma forma efusiva, alegre, calorosa, dizendo o quanto estava “sastifeito”pela princesa que eu era, uma criança inteligente e criativa. Eu o corrigi: “Pai, não é assim que se fala”. Corou, nada mais falou. Quando o amigo foi embora, sentou-me em seu colo, como sempre fazia, e me disse baixinho: “Nunca mais me corrija na frente de ninguém, faça isto quando estivermos sozinhos”. Até hoje me lembro de como fiquei triste comigo mesma e do quanto me senti feia dentro dos seus olhos úmidos. Fico magoada cada vez que me lembro disto e sei que jamais amei alguém tanto quanto amei papai. Hoje sou professora de Português e a primeira lição que ensino aos meus alunos de quinta série é a de respeitar o jeitinho de falar de nossos pais, avós, amigos. Se você sabe o padrão culto da língua materna, use-o, sem constranger ou corrigir, pois palavras não nasceram para ferir ninguém.


Liz Rabello



O OLHAR DE UM CÃO

Ao longo de toda minha vida, tive, realmente, amigos fiéis, leais, amorosos. Amei e fui amada por familiares mais próximos e queridos, que partiram por conta da roda viva da vida, que nos traz para esta esfera e nos leva embora. Amo e me sinto amada pelos que aqui estão: filhos, neto, nora, tios, primos, amigos do dia a dia, reais e virtuais, inúmeros alunos, do passado e do presente! Mas nada, absolutamente nada, pode ser comparado ao olhar de um amigo canino... É puro amor, deleite, carinho, caridade, entrega sem cobranças, sem egoísmo, sem vaidades, sem rancores, abanos de rabinho com perdão, proteção, confiança, petição: “Ama-me porque eu te amo”- Eu digo. Ele não: “Amo, porque amo”. Simples assim! Penso que se o mundo canino falasse, as palavras de Cristo seriam mudadas: “Ama teu próximo mais do que a ti mesmo!”



(Liz Rabello, in INTERVALOS, “MEUS AMIGOS PELUDOS E OUTROS MAIS”
 Beco dos Poetas, 2013. SP)