ARMADILHAS
DO DESTINO
”Entrega
o teu caminho ao Senhor, confia nele e o mais Ele fará.” (Salmo 37)
O adolescente
estava saindo da loja. Deu um abraço forte e beijou a mãe no rosto. Depois foi
embora com o pai e eu já sabia que aquele homem era o marido da dona da loja.
Retomamos o papo de onde havíamos parado. Eu contava sobre
minha saúde e de como me cuidava para não engordar demais. Minha amiga já
estava com quilos a mais e me afirmou com muita naturalidade que não se
importava com isto, pois os remédios que tomara é que eram responsáveis pelo
excesso de peso. Conversa vai, conversa vem e eis que me fala para qual motivo
era aquele “tratamento”. Não conseguia engravidar. Os últimos resultados dos
exames já diziam que nenhum medicamento reverteria aquela situação. Percebi no
olhar dela uma mágica alegria ao ver os dois,
pai e filho abraçados, partindo para uma pelada de futebol no campinho
mais próximo. Não consegui segurar minha curiosidade e detonei: como assim, não
podem ter filhos? E aquele jovem, tão simpático, quanto lindo, quanto
carinhoso, foi adotado? Os olhos dela se encheram de lágrimas e reavivando a
dor, a memória se soltou.
AMOR
TECE
DOR
A
(AUSÊNCIA DE) MORTE
AMORTECE
(DOR)
AMORTECEDOR
O
mecânico já havia avisado que os amortecedores não estavam bons. Precisavam ser
trocados. Pneus carecas. “Este carro não tem condições de viajar”. Insistiram.
Afinal Jundiaí é muito próximo da capital. Domingo. Pouco trânsito. Dito e
feito.
A irmã
de minha amiga chegou com o marido e o bebê de meses. Almoçou. Naquela semana
havia desmamado a criança. Ele já estava tomando sopinha, mamadeiras de leite
ninho, que foram cuidadosamente feitas pela mamãe feliz e prestimosa. Embora
jovem, com apenas dezesseis anos, minha amiga curtia cada frase de ensinamento
que a irmã mais velha casada e tranquila lhe passava. Riram muito e brincaram
demais com o menino alegre, que quase não chorava, só sorria, bebendo em cada
olhar os encantos da mamãe. O pai também participava de tudo com muito prazer.
De longe era possível sentir a felicidade de todos. E como se possível fosse
segurar o tempo, dele faziam proveito com a ternura de quem não quer que acabe
nunca!
A noite chegou tristonha, com garoa fina,
asfalto gelado e escorregadio. A temperatura caiu de repente, consideravelmente.
Até cobertores colocaram dentro do carro para aquecer o bebê. Um tempão para arrumar tudo. Na despedida,
beijos foram trocados, os avós à porta emocionados acenavam na partida. O carro
se foi. Nem bem chegou à esquina, deu meia volta. O que será que esqueceram?
Nada... Apenas a irmã mais velha, retira do carro sua maior preciosidade e
deposita o bebê no colo de minha amiga e lhe diz convicta: “Cuide dele para
mim, amanhã virei buscá-lo, está frio demais para esta viagem”.
Partiram
tão depressa quanto jamais voltaram. O
bebê em despedida chorou de leve e como um presente de Deus permaneceu nos braços
de minha amiga para sempre.
Liz
Rabello