quarta-feira, 11 de agosto de 2021

 
ALFABETIZAÇÃO... UMA BRINCADEIRA!

Fui alfabetizadora durante dezoito anos seguidos, num tempo em que meus filhos eram pequenos e, eles próprios vivenciavam estes momentos de primeiros contatos com a leitura e escrita.

Meu filho mais velho me deixou traumatizada por conta de que problemas familiares me fizeram optar por uma escola maternal para ele. Aos dois anos já estava frequentando o Colégio Pato Donald, que funcionava dentro do prédio do São João Gualberto; e, portanto, não era adaptado à criança tão pequena. Seus garranchos e rabiscos iniciais eram pautados de conceitos como “PÉSSIMO”, “SEM CAPRICHO” ou outros sinais de que quem o estava direcionando para os primeiros contatos com a alfabetização não tinha a menor ideia do mal que fazia para uma criança de dois aninhos. Se fosse hoje, eu o teria tirado daquele espaço num piscar de olhos. Quando entrou para o ensino fundamental já estava farto de escola, carteiras, lousas, lápis e cadernos. Reagiu como alguém que não tinha capacidade para aprender. E tinha.

A diferença entre os irmãos é de oito anos. Minha experiência negativa com o mais velho, deixou-me cautelosa com o mais novo. Não o coloquei na escola maternal, mas sim bem mais tarde. No entanto, por não ter com quem deixá-lo em casa, muitas vezes eu o levava comigo para a sala de aula. Usava vários materiais para a aprendizagem dos meus alunos e um deles eram os cartazes da Caminho Suave, a Cartilha e os varais. Tinha um jogo velho que deixei em casa e o meu filho se apropriou para brincar. Um dia eu o peguei no fundo do quintal pendurando os cartazes no varal de roupas e ensinando as galinhas a ler:

RA RE RI RO RU RUA!

SUAS GALINHAS BURRAS!

Ri muito da cena. E fiquei meditando se eu também não usava de brincadeiras para com meus aluninhos pequenos da Rui Bloem, onde lecionava. Acredito que sim... Um deles vivia me dizendo: “Já estou ficando cafuso... É muita letrinha pra me torturar!”


É claro que as galinhas jamais aprenderam a ler, mas o Rodrigo, sim! De tanto ensiná-las, quem se auto alfabetizou, foi ele próprio. Certa vez me disse num repente: “Mamãe, eu sei ler.” Abriu a Cartilha Caminho Suave e leu: LARANJA. Havia o desenho da laranja e eu menosprezei a leitura. “Oras, você leu a imagem” – E ele mudou a página. Desta vez leu DADO. E novamente deduzi que a imagem é que decifrava o código. Ele se irritou e leu SAPO... A mesma repetição dos fatos. Para me provar que sabia ler não mudou de página, apenas leu uma das palavras da lição do sapo: SALADA! Oras bolas e num é que era o SA do sapo, mais o LA da laranja, mais o DA do dado???? Ele ficou realmente zangado e berrou: “EU SEI LER!” E leu a página toda e depois outras páginas, enquanto muito emocionada eu o beijava de alegria... pois jamais o ensinara, apenas o deixei brincando com todo aquele material de alfabetização. Quando aos quatro anos eu o coloquei na escola Chácara Mundo Feliz ele já sabia ler e escrevia muitas palavras que aprendera sozinho por seu próprio interesse.


Isto me fez aprender a ensinar! E, principalmente a refletir sobre o que é que eu ensinava realmente quando queria ensinar algo que tinha em mente. Na verdade, não é o conteúdo, nem o material que importa, mas o MODO como fazemos o nosso trabalho.

Liz Rabello

GRATIDÃO