terça-feira, 11 de março de 2014

Eliana - Ao mestre com carinho

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AO MESTRE COM CARINHO

O estranho de tudo isto é que, em geral, somos nós, os humanos, que escolhemos animais de estimação. No caso, Nininha nos escolheu. Meu sobrinho e meu filho passavam em sua casa, diariamente, e ela abanava seu rabinho de vira-lata, no porte do capa preta pastor alemão, olhinhos sapecas e inteligentes, dignos da mescla de um erro de sua mãe... Uma pedigree apaixonada por um vira-lata. Passavam dali, paravam e com ela brincavam. Um dia, fugiu por uma fresta do portão e os seguiu. Eles “juram” que tentaram devolvê-la. Eu trabalhava demais e não queria problemas. Quando a Menina chegou, logo impus minhas regras. Fica na lavanderia. Nada de entrar dentro de casa! E ela obedecia! Linda! Estávamos próximos ao Natal. Final de ano letivo, formatura dos meus alunos de oitava série. Era a paraninfa deles e estava ajudando na organização do evento. Ensaiávamos juntos “Ao Mestre com Carinho” e esta música não me saía da cabeça. Eu a cantava em todos os lugares por onde estava: no carro, no chuveiro, lavando folhas de alface na pia da cozinha. Distraída, não observei que Nininha chegou bem pertinho. Como era de praxe, eu lhe dizia: “Aqui, não! Volte para sua casinha!” Ela voltava. Era obediente demais. Mas sua maior característica era a sensibilidade e a inteligência. Naquela manhã de sol, os raios perpassavam pelas veias singelas das folhas de alface e meu coração foi tocado pelo amor! Nininha me acompanhava, de olhos fechados balançava a cabeça no ritmo e nos acordes da canção! Nunca mais eu a toquei para sua casinha. O espaço dela adentrou para o meu. Nós nos tornamos amigas para além da vida! E ela sempre soube que eu a amava de verdade. Quando o câncer tomou conta dela, precisou fazer cirurgias, aguentou cinco antes da Metástese. E ela o fazia com a sabedoria de quem entendia que precisava deixar-se passar pelo sofrimento da dor para poder perder a dor maior! Era um encanto vê-la confiar em nós três. Eu e meus filhos cuidávamos dela com muito amor! Já se passaram muitos anos e eu a guardo na memória com o mesmo encanto da primeira vez. Sou professora e ensino o valor das palavras, mas foi com a minha Nininha que aprendi o valor da sensibilidade e do amor! Amores assim são eternos!


 (Liz Rabello, In INTERVALOS, Editora Beco dos Poetas, 2013)

sexta-feira, 7 de março de 2014


ALÉM DAS PEDRAS
De tempos a tempos, me atiram pedras. Chegam de quem menos espero. Como ondas gigantes do mar a bailar, eu rochedo a me quebrar. Palavras tortas sangram rios, torrentes de revoltas! Não as quero ouvir, pois sempre meus olhos buscam além das pedras, muito embora elas sejam jogadas em mim como água benta, tentando polir arestas. Mil vezes repito: Podem jogá-las, ainda construirei um castelo! À porta de ferros, um jardim de pedras. De minha mente, gramado verde a florir intensamente e fazer valer a vida! 


Liz Rabello

ONDE ESTÁ O AMOR?

Há sempre um ponto
Uma encruzilhada
Um banco
Uma esquina
Um lance de olhar
Uma gota de orvalho
Uma luz ao luar
Uma fonte a jorrar
Uma chuva constante
De lindas notas musicais
Onde o amor está



Há sempre uma porta aberta
Uma janela a sorrir à luz do sol
Uma flor abrindo pétalas de cores
Exalando mil aromas
Gritos e gemidos de orgasmos
Lances de poesia dos sorrisos de crianças
Lambidas e carinhos de animais de estimação
Onde a única nota musical a soar é o Amor!


(Liz Rabello)

quinta-feira, 6 de março de 2014



DE DENTRO DOS LIVROS...

Se agasalham os sonhos
Para não morrerem de tédio
Casulos permanentes
Quando se abrem as páginas
Ah, que gozo magnífico
Borboletas voam
Desapegadas
Alegres
Livres sem noção
Loucas de emoção
Em queda livre
Precipício de incertezas
Asas de uma asa delta

Liz Rabello



RAIOS DE LUZ 


Que venham ecos de montanha 
Raios de luz nas manhãs geladas 
Puros reflexos na água parada 
Encantos das auroras reiniciadas! 

Que venham azuis dos mares 
Transparentes e límpidos olhares 
Que nada é perdido no tempo 
Ventos uivantes nos penhascos! 

Que venham novas memórias 
Mandando embora ares poluídos d'outrora 
Tempestades riscadas por outros encontros 
Relíquias esquecidas de folhas viradas! 

Liz Rabello

quarta-feira, 5 de março de 2014


POR DO SOL EM PIEDADE


Poesia que vem da noite
céu amarelo laranja abraçando a lua
azul escondido nas tardes que se vão
apagando luzes em  contradição!


Poesia que vem do sol
céu amarelo laranja girassol
fogo queimando tardes de verão
acendendo luzes em meu coração!




Liz Rabello

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014



VOO EM PÁGINAS

Livros naufragam palavras

sons deslizam chamadas

batidas de corações
Alcançam pensamentos
em círculos
que voam voltam
revoam revoadas 
de luzes e toques
sentidos aguçados
para aquele que me faz
que me traz
que me apaixona
Segundos de ilusão
mãos que se descuidam
se agarram, se tocam
realidade ficção
a quatro mãos voando
virando páginas da vida!

Liz Rabello



TOQUE MÁGICO

 Há algo de mágico em ti
É especial este teu voo
Sinto-me nas nuvens
Vertigem nas alturas
Avesso aos pés no chão
Alucinantes viagens
Pelos céus do infinito
Rainha de teu querer!

Cantigas de ninar
Olhos fechados
Rosto colado
Em teu peito deitada
Sensação vertiginosa
Queda livre bem gostosa
Deixar-se levar
Pelo vento a soprar!

Há algo de mágico em ti
É inusitado este sentir
Novo modo de ver
Corpos entrelaçados
Cavalgando estrelas
Roubando fios de água
Suor do universo
Em corpos nus!

(Liz Rabello - In Delicatta VIII - 2013)

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014



TÃO LONGE
TÃO PERTO!

Como o reflexo da água
Vejo-te na transparência
Das miragens eternas!
Vejo-te na imensidão do mar
No buraco negro do infinito
No meio das nuvens a se dissipar!
Vejo-te no clarão do luar
No sol brilhando, orvalho secando
No vento a dispersar manhãs geladas!
Vejo-te assim tão distante, além mar!
Longe demais o coração a clamar!
Sentimentos quentes, sussurros a escutar!
Vejo-te e sei que não são apenas miragens
Angústias de quem ama em solidão
Tão longe e tão perto do coração a saltar!

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

ESPERA



ESPERA

Olho para a lua
Procuro teu olhar
Que se dissipa nas nuvens
Não há o que encontrar!

Olho o infinito...
Pingos de estrelas brilham
Estremeço a luz do teu olhar
Por segundos pareço te encontrar!

Mero sonho, desejo vão
Nada a esperar, dedos vazios
Na fome de te amar,
Coração descompassado
Louco a esperar... A esperar!

(Liz Rabello)

CÓDIGO AGV


"Uma tarde, meu pai pegou a lanterna e me levou para o castelinho! Lá no Condomínio, diziam que aquele lugar fora palco de uma tragédia. Um casal começara a construção da torre para a única filha, uma princesa de cinco anos. Após um acidente na piscina, em que a menina perdera a vida, os pais nunca mais ali apareceram! Abandonaram a propriedade e tudo se transformou num lugar mal assombrado! Teias de aranha e morcegos ali dentro não dormiam! Ficamos por lá, eu enfrentando o medo! Naquela noite de lua escondida, o sol nos abandonou de repente, sem que tivesse tempo de explorar o ambiente! Meu pai me disse que não sabia voltar. Mentira para me assustar! Conseguiu, porque andei pelas ruas desertas chorando o tempo todo e nada que pudessem fazer para me acalmar. Foi quando a vi dirigindo o seu carro. Vovó viera me buscar e me abraçou com a magia do amor e a segurança que me tirou da dor!
  
Quatro rodas a girar
Siga o vento,
Que vai te mostrar!



Tudo me levava aos tempos antigos... Agora as quatro rodas do carro da vovó... Como gostava de dirigir! Era sua paixão!"

(In INTERVALOS, "CÓDIGO AGV", por Liz Rabello, Editora Beco dos Poetas, 2013)

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014



BOLHAS DE SABÃO

Vou brincar com bolhas de sabão
Acreditar que a vida não é sonho vão
Enlouquecer paredes com sopros de funil
Escorregar tijolos de matiz
Anil róseo escarlate
Ao vento driblando
Rolando girando
Meu coração saltitando
Sorrisos doçuras de mel
Só criança é feliz assim!

Vou brincar com bolhas de sabão
Dentro delas dores mil
Casinhas de papelão
Barquinhos sem velas
Lua sem estrelas
Sol sem brilho próprio
Árvores sem folhas
Lagos sem peixinhos
Saudades sem olhos úmidos
Vento, leve embora minha dor!

Vou brincar com bolhas de sabão
Dentro delas muita luz
Esperanças verdes Liz
Olhos de serenatas
Canções e perfumes de jasmim!
Num impulso de alegria
Mãos seguram a euforia
De ver bolhas explodindo
Levam a dor e o amor
Levam saudades e esperanças!

Sorriso desaparece dos lábios
Vento parou
Mãos molhadas
Surpresa chegou
Brinquedo acabou!

(In ARMADILHAS DO DESTINO, in INTERVALOS, por Liz Rabello,
 Editora Beco dos Poetas, 2013)

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014





LAÇANDO A FELICIDADE!

Começo de mais um dia
Fantástico!
Diferente!
Criar nova oportunidade
Com o pé direito,
otimismo à flor da pele!
Distância de quem não acredita
Que a cada instante tudo se renova!
E é possível crescer!
Angariar multidões
para um novo modo de
“Ver”
”Fazer”
”Esculpir” o Amanhã!

(In MIL PEDAÇOS, de Liz Rabello, página 19, Editora Beco dos Poetas, 2012)

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014





ESQUECER

As manhãs me pegam nua
Faminta do amor que a noite teceu
Vestida de cores e luzes do alvorecer
Sons do vento batendo nas folhagens
Trazem hálito de flores perfumadas
Mas teimam em me desaquecer
Águas mornas do chuveiro
Esquentam meu corpo em prazer
Roupas leves sedas suaves
Cremes e dedos afagam meu ser
Demoro a me vestir de vida
Rotina me puxando pra valer
E só me fazendo esquecer
Sonhos que embalavam meu viver!

Liz Rabello

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014


CABEÇA DE FLOR?

É a minha?
 Se for... Amei.
 Se não flor... Amei também... 

Liz Rabello

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014


ESCURO

 Pessoas ausentes
Vêm e vão
Transcendem
Nossa existência
Permanecem do
Outro lado do muro...

Por mais que busquemos
Brilham distantes
Faíscam sorrisos
Vagalumes eternos
Na noturna escuridão...
Fuga fugidia na neblina!

Há sempre uma ponte
Possibilidade de laços
União entre pedras
Ondas a revoltar
Buracos do infinito!
Acredito no escuro!

HÁ SEMPRE UMA PONTE ONDE É POSSÍVEL CRIAR LAÇOS DE UNIÃO ENTRE PEDRAS, BURACOS QUE NOS TRANSCENDEM PARA O INFINITO. ASSIM É COM PESSOAS AUSENTES, QUE SE MANIFESTAM EM NOSSA EXISTÊNCIA, PARA PERMANECEREM DO OUTRO LADO DO MURO... POR MAIS QUE BUSQUEMOS A UNIÃO, MAIS DISTANTES ESTÃO! SÓ QUE EU ACREDITO NO ESCURO!

Liz Rabell
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UM LUGAR ONDE O TEMPO PAROU 


Pinheiros verdes 
Farto matagal 
Túnel de espinhos 
Folhas secas 
Janela aberta 
Cadeado estilhaçado 
Mel de abelhas 
proteção! 
Roupas no varal 
A balançar 
A chorar 
Saudades 
Teias multifacetadas 
Fios de sonhos 
Tecidos perdidos 
No tempo do jamais 
A morte chegou 
O relógio parou! 

Liz Rabello



Era uma enorme área coberta por um farto matagal. Cercada de grandes pinheiros, que na época chegavam a quatro metros de altura. Quando caminhávamos pelo condomínio, parávamos curiosos em frente ao grande portão de madeira talhada, a olhar pelas frestas, em busca de um sinal de vida. Difícil falar do abandono. 


Percebíamos pelas plantas crescidas em meio às ardósias que há muito tempo ninguém ali pisava. Certa vez tio Digo e seu amigo foram barrados pelo vigia do lugar: “O que querem aí nesta propriedade?” A resposta veio certeira: “Apenas curiosidade!”. Após as devidas identificações, souberam que aquela área abandonada era alvo de pessoas que queriam tomar posse, já que supostos proprietários não a defendiam. Souberam que a dona, uma senhora idosa, ali morrera, sozinha, dezoito anos antes daquela data. 


Uma tarde, de volta ao lugar, de posse de um celular, os dois ali entraram e constataram cenas de terror, dignas de um filme de casa assombrada. Teias de aranha em todos os vidros!


Uma moradia que perpassava o tempo, muito bem construída, sem rachaduras, sem infiltrações de água, envidraçada por toda a varanda e nelas, enormes teias de aranhas, cujo habitat, lhes era tão natural, seu único espaço desde sempre.


Houve necessidade de se agachar e passar por um túnel de espinhos de primaveras em flor, para chegar do outro lado da casa.


 Lá encontraram outro jardim de inverno, com cadeiras em ferro trabalhado, lindas! Folhas secas ao chão e, novamente, teias multifacetadas de fios a tecer cantos de sonhos perdidos no tempo do jamais.


Na lavanderia, roupas ainda estendidas no varal, demonstravam que aquela senhorinha não pretendia deixar de viver. 


O mais impressionante era a cozinha. Uma mesa de madeira, quatro cadeiras arrumadinhas, toalha de renda e vaso com flores, pratos a secar sobre a pia, prontos para o próximo uso, que nunca vingou! 


Do outro lado da casa, uma janela arrombada, cadeado estilhaçado, vidros semi abertos, uma cama de casal vista através das manchas escuras e sujas dos vidros da janela. Nada mais foi possível fotografar porque abelhas faziam colméias e afugentavam sem dó qualquer ser humano que dali se aproximasse. Mel a proteger o sonho!


Quando disse à vovó que queria ir até lá com meu tio ver de perto aquele lugar assombrado, ela não titubeou: “Não, não quero que vá, que te arrisques a ferroadas de abelhas, nem a picadas de cobras, nem que fiques enlaçado a uma teia de aranha... Só quero que me prometas que após a minha morte jamais deixarás nossa chácara assim!” 

Agora me vinham à mente palavras, envoltas em teias tecidas pelas lembranças e eu me emaranhava nos sonhos dela e só desejava parar o tempo, volver as horas e fazer-lhe a vontade: Cuidar do nosso cantinho de amor! 

(Liz Rabello- In “CÓDIGO AGV”, AMOR SEM FIM, Editora Beco dos Poetas, 2012)