segunda-feira, 29 de dezembro de 2014


AQUI É BARATO!

Muitos são os meios que as pessoas usam para vender seus produtos ou fazerem propagandas de serviços prestados. Mas este foi inusitado. Diariamente saía da escola que trabalhava, atravessava a rua e me deparava com um papagaio. Simpático. Agradável e muito conversador. Parava, tocava em seus pezinhos e fazia carinhos nas pontas das unhas afiadas. Perguntava o nome e dizia o meu, que jamais aprendeu.  Seguiam-me os alunos da primeira série. Era uma festa na porta do mini bar, restaurante, pastelaria que ali se escondia...

Certa vez ele gritou ofegante nos surpreendendo: “AQUI É BARATO!”... Rimos muito e passamos a retrucar... “BARATO NADA... AÍ É CARO!

O esperto então nos surpreendeu com uma fúria sem igual: “BARATO, BARATO, BARATO!” Dando fim ao papo.

Liz Rabello 

terça-feira, 23 de dezembro de 2014



SABEDORIA DO OUTONO

Meu Eu... Casulo amordaçado 
Fios de sonhos perdidos 
Atados a noites escuras 
Gélidos invernos de dor 
Lápides frias de cemitérios!

Meu eu... Casulo cinzento 
Semente de amor escondida 
À procura de terra fértil 
Água límpida de nascentes 
Manhãs de sol primaveril!

Meu eu... Fruto maduro 
Macieira perfumada 
Outono esquecido no tempo 
Preso às malhas do destino 
Sem razão para existir!

Esquece teus finais 
Hora de recomeçar 
Borboletas frágeis, 
Em margaridas a dançar 
Sangra arestas, cria pontes!

Voa, voa, voa! 
Livre... Solto 
Liberdade conquistar!

Liz Rabello (In INTERVALOS, 2013, Beco dos Poetas)

sábado, 13 de dezembro de 2014



ASAS EM VERSOS



Saltei no precipício
Voei 
as asas quebraram
você veio
colou uma por uma
Dédalo e Ícaro
no espaço
em busca de mais amor

Liz Rabello


quinta-feira, 11 de dezembro de 2014




BOLINHO FRITO EM ÓLEO FRIO

Era um tempo sem computador. Máquina de escrever manual, nem eletrônica era, porque dinheiro não tinha não. Todo o salário ia para a PUC, a fim de pagar os créditos do Pós Graduação Mestrado em Comunicação e Semiótica. Fim de semestre e estava escrevendo a monografia de final de Curso. Se errasse era obrigada a começar tudo de novo. Estava aflita porque o prazo de entrega se aproximava. Coloquei o mais novo para dormir em minha cama (tinha uns dois anos, pouco mais). Já era viúva e meu filho mais velho dormia no sofá. Um lindo verde musgo de tecido aveludado com almofadas combinando. Lá pelas duas da manhã, ouvi um barulho estranho na sala. Larguei tudo e fui ver o que era. Por Deus! Que situação!

Meu filho mais velho era pura farinha no rosto todo, cabelos olhos, orelhas, ouvidos e tudo quanto era buraco melado de farinha grudada em óleo. Um saco vazio e uma lata inteirinha salpicada no sofá e nas lindas almofadas. Quem foi o autor da traquinagem? Meu filho mais novo, que me vendo ocupada fez do irmão bolinho frito em óleo frio.  Levei o mais velho ao chuveiro aos tapas para acordá-lo, porque temia por sua respiração. Além das roupas, sofá, almofadas e tapete, tudo se perdeu naquela noite fúnebre. Só salvei o menino que acordou aflito sem saber por que estava apanhando!

Até hoje agradeço a Deus pelo pequeno porte do autor da arte, que não alcançava o fogão, do contrário o irmão iria virar bolinho frito em óleo quente.

Já dizia o poetinha Vinícius de Moraes, em seu poema Enjoadinho:

Filhos...  Filhos?
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-lo?
Se não os temos
Que de consulta
Quanto silêncio
Como os queremos!
(...)

Chupam gilete
Bebem shampoo
Ateiam fogo
No quarteirão
Porém, que coisa
Que coisa louca
Que coisa linda
Que os filhos são!


Liz Rabello