INJUSTIÇA
Manhã nublada de dezembro. Às vésperas do Natal, levanto ansiosa e triste e meu coração me leva até um passado doloroso.
Recebi uma carta anônima. Envelope vermelho. Letra masculina. O que li me fez ficar tão abalada que bati o carro. Ofensas sem limite: “Viúva frustrada”... “Não consegue ver ninguém feliz”... “Invejosa”... “Fofoqueira”... “Infeliz”... Por outros detalhes, percebi quem era o autor dos desaforos maldosos. O Coordenador Pedagógico da escola que eu trabalhava. E agora, com muito ódio, afirmava que faria da minha vida um inferno... Um homem que dias atrás eu vira seduzindo uma amiga minha, jovem, casada, que eu considerava como filha. Com elogios, tentava beijá-la. E ela correspondia, completamente fascinada. Na hora H, li nos lábios dele: “E agora, ela viu!”- Ao que minha amiga respondeu: “Sem problemas, a Bete é minha amiga.” Eu não escuto bem há muitos anos. Por esta razão, não participava de fofocas nos intervalos da escola. Ficava muito calada, e todos tinham confiança em mim. Mas aquela cena me perturbou. Eu me senti na obrigação de alertar. Poucos dias depois, fizemos uma viagem juntas, como sempre fazíamos. No trajeto, eu ao lado dela, a ouvia triste, contava como a tal criatura a incentivava a fazer pós-graduação, Mestrado, e como afirmava elogios sobre sua beleza e inteligência... Eu poderia ter ficado calada, mas não fiquei. Alertei sobre os fatos serem verdadeiros e para tomar cuidado com segundas intenções daquele homem. Não comentei isto com mais ninguém, a não ser com minha amiga. Mas ela, ingênua, ou apaixonada, não sei, levou minhas palavras a ele. Ficamos de férias e três dias depois, recebi a carta anônima ameaçadora.
Durante as férias, a pessoa me difamou de tudo quanto foi jeito. Passou adiante a cena, dizendo que era eu quem a estava alastrando. Quando as férias terminaram e um novo ano letivo escolar se iniciou, fui recebida com caras e bocas, sem amigos, com ódio por todos os cantos. Não sei como aguentei aquele meu último ano na escola onde fora feliz por quase trinta anos. Pedi aposentadoria, que não saiu, depois solicitei mudança de escola. Levo comigo esta injustiça. E sei que mesmo depois de ter saído de lá, ainda carrego a cruz da perseguição daquele podre homem, congelada no tempo.
Só recentemente rasguei a carta.
Tinha a intenção de mostrá-la para minha amiga. Mas não precisei fazer isto,
porque vejo pelas redes sociais fotos lindíssimas de seu casamento, férias,
marido, filhos! O que eu queria que ela fizesse, ela fez... Valorizou o real, o
verdadeiro! Fez Mestrado, Doutorado, mostrou seu valor ao mundo! Eu não preciso
me defender de nada. Minha consciência está tranquila.
Liz Rabello