terça-feira, 3 de março de 2015

UM LINDO TEXTO DE MINHA AMIGA LEDA BOSSI... UMA MENSAGEM PARA O COTIDIANO, COM SENSIBILIDADE, EMOÇÃO, FÉ E MUITO, MUITO CORAÇÃO!


"Monto meu prato no self service. Uns verdinhos, grãos, tiquito de arroz, algo ali que me interessa...e eis que me deparo com o ...ovo cozido, partido ao meio. Pulo uma metade para dentro de meu prato e vou feliz com o achado, saborear tamanho pitéu! Começo a lembrar dos tempos de infância, quando bife não se comprava tão à vontade como hoje em dia, e o costume era comer um belo ovinho frito, gema mole, se espalhando sobre o arroz fresquinho. Salmonella? Nem se imaginava a existência desse perigo!!! Hoje, sei que é proibido pela vigilância sanitária servir um ovo tão inocente assim. E era tão bom!!!!Do ovo mexido, nunca fui muito fã.Mas na Alemanha deparei-me com ovos mexidos sensacionais na intensa cor alaranjada e com sabor digno de custar o equivalente a 12 reais, no sanduba. Nessas circunstâncias de preço, come-se até o último farelinho e lamenta-se por não repetir a porção. Mas no meu prato que já estava pela metade, estava ali o meio ovo, esperando ser degustado e eu o pulverizei com um salzinho tornando-o ainda mais atraente.Tem uma coisa que me toca quando papo um ovo cozido e vai além do paladar: É que volta à minha memória Jesus dizendo: “ Quem de vós, que o filho pede um ovo e você dá um escorpião?” ( Lucas 11). Pronto!!!! É tuuuudo! Penso que hoje seja meio difícil uma criança pedir um ovo. Tem tantas coisa mais atraentes e complicadas para se desfiar os pais... mas enquanto mastigo a plástica clara que se une à esfarelenta gema bem cozida, penso na criança do lugar rústico em que Jesus viveu, naquela aridez, onde certamente um ovo tratava-se ( e deve ser assim também nos dias atuais) de uma pequena preciosidade.Ovo cozido para mim, tem gosto de certeza de que Deus considera de modo ultra elevado as nossas pequenas e infantis petições. Ele sabe melhor que nós mesmos, o que nos convém na jornada da vida.Podemos estender nossas mãos sem medo, que não cairá nelas nem uma cobra, nem um escorpião. Findo o ovo, finda a refeição, sigo meu caminho com passos de criança confiante nos desígnios do Pai."

Leda Bossi


Quando era criança nossa maior alegria eram os pintinhos nascendo. Nunca comíamos os bichinhos de estimação que acabavam virando, mas os ovos... Ah, os ovos eram OURO nas nossas refeições. 




Até hoje tenho muito carinho por estes bichinhos... Neste dia ela havia botado o primeiro ovinho... Lindo que só!





sábado, 28 de fevereiro de 2015

SER MÃE É FATAL

“O que usa de engano não ficará dentro da minha casa; o que profere mentiras não estará firme perante os meus olhos!” Salmos 101:7

 “A barata diz que tem sete saias de filó... É mentira da barata, ela tem é uma só...” Este era o refrão predileto do meu filho mais novo. Cantava para o Ro, enquanto o colocava sentado em cima da mesa, eu em pé, para a gente poder trocar beijinhos de pertinho, abraços intermináveis e carícias com os olhos. Ele adorava sentir meus cílios tocando os dele, em sintonia com nossas piscadinhas. Quando parava de cantar para ele e lhe dizia que seu nariz já estava crescendo igualzinho ao do Pinóquio, era o momento certo para que me contasse mais um pouquinho da sua louca aventura. Aos poucos, ia costurando os fatos mais doidos de minha pior e mais fascinante experiência materna. Por Deus, como é difícil ser mãe!  E eu cutucava as memórias daquele menininho apronta quieto, esperto, amoroso e muito falante! – “Quer dizer, então, que a baratinha pegou um ônibus” – E ele continuava a história... “O home disse pra mim: Cuidado, menino, você vai cair!” Em outros momentos, frases curtas: “O onbus abria a porta e fechava, cansei, desci”. Certa vez, ao voltarmos das compras, passei embaixo do viaduto que ligava meu bairro à Vila dos Remédios, o carro atrás de um veículo, quando meu filho falou: “Mamãe, meu onbus passou daqui, tinha aquele dois ali e era verdinho”. A despeito de minhas ansiosas indagações, respostas chegavam só quando bem entendia. Uma tarde, no clube que frequentávamos, quando passávamos pela catraca para entrar na piscina, ele gritou: “É igualzinha do meu onbus!” Eu jamais o levara para passear de ônibus, embora meu filho sempre pedisse.

LIBERDADE FEMININA

“O SENHOR é o meu pastor, nada me faltará. Deitar-me faz em verdes pastos, guia-me mansamente a águas tranquilas. Refrigera a minha alma; guia-me pelas veredas da justiça, por amor do seu nome. Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam. Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos, unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda. Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na casa do SENHOR por longos dias.” Salmos 23:1-6

 O Rodrigo chegou oito anos após o meu primeiro filho. Estava trabalhando na zona leste, muito longe de casa. Precisava iniciar uma faculdade para conseguir pontos, ficar bem classificada e escolher uma sala de aula num colégio mais próximo. Fiz inscrição para exames de vestibular, no Curso de Letras, planos para finalmente realizar meus sonhos de mulher: ESTUDAR! Quando descobri que estava grávida, meu marido tentou me impedir de continuar com estas ideias. Ou uma coisa, ou outra! Não dá para ser mãe, trabalhar e estudar ao mesmo tempo. Citou a palavra aborto. Sei que não era o que queria. Força de expressão para me forçar uma decisão. Esta chegou rápida, como as batidas do coraçãozinho do meu amor. Eram tão fortes que eu o sabia vivo, um ser minúsculo gritando fome de vida dentro do meu ventre! Minha resposta não poderia ser outra: “Quero tudo!”

Sou de um tempo em que a mulher não tinha vez, nem no mercado de trabalho, nem nas decisões políticas, muito menos no prazer sexual. Em nossa cultura, o centro de tudo era o homem. Foi a minha geração que conquistou esta esperança de liberdade. O advento da pílula anticoncepcional nos trouxe a possibilidade da liberação do orgasmo, muitas vezes contido pelo medo de gravidez indesejada. O mercado de trabalho abriu portas para a mulher, não sem antes fechá-las a todos, inclusive aos homens. Tanto que até hoje, mulheres ganham menos do que homens. E, atualmente, retiram deles vagas no mercado de trabalho, por pura contenção de despesas. Manifestações políticas roubadas ao tempo nos ajudaram nesta busca de liberdade. Sou de uma época em que mulheres permaneciam casadas a vida toda, insatisfeitas, porque não podiam ser rotuladas, a força de ficarem “faladas”. O divórcio trouxe a possibilidade de sonharmos de igual para igual. No entanto, esta luta feminista também nos deu a amargura da sobrecarga. Temos que nos desdobrar em duas, três, dez mulheres ao mesmo tempo para darmos conta de toda responsabilidade que abraçamos. Desde menina, eu quis ser livre. Trabalhar e estudar eram e são até hoje metas essenciais, mas ser Mãe, nos é fatal! E como é difícil, meu Deus, largar filhos nas mãos de estranhos! Ainda ouço as palavras derrapadas rua abaixo, quando saía para trabalhar e deixava meu filhinho de menos de dois anos nos braços da babá: “Mamãe, eu te amo, não demola pra voltar di casa!” Dirigia meu carro de vidros abertos para colocar uma das mãos para fora da janela e acená-la em adeus, olho cheio de lágrimas! Choro toda vez que me lembro destas cenas e aproveito cada oportunidade que ainda tenho para beijá-lo e lhe dizer que também o amo até hoje! E o amarei eternamente!
AGOSTO: UM MÊS DE DESGOSTO

“Pois quanto maior a sabedoria, maior o sofrimento; e quanto maior o conhecimento, maior o desgosto”.  (Eclesiastes 1:18)

 Hoje percebo claramente o que minha intuição dizia muito antes de se tornar real alguns fatos que aconteceram depois. Perdi os meus entes amados, mais amados, sempre neste mesmo mês: marido, mãe, sogros, vovó Constança, Dindinha... Todos partiram assim, no meio da fumaça das queimadas, que mãos insanas ateiam fogo, quando a música das chuvas não limpa os céus de seus trovões costumeiros. Um ano antes de ficar viúva, eu e meu marido nos separamos. Foi um agosto triste para os quatro. Nós dois e as crianças sofremos demais! Minhas muletas foram os livros! O trabalho! E meus filhos, minha salvação! Aquela primavera chegou tensa. Precisava espairecer. Decidi fazer uma viagem para o litoral sul, só eu e meus meninos. Consegui reservar um cantinho. Paguei antecipadamente, com um cheque pré-datado por um apartamento em Peruíbe. Mas, ironia do destino, a proprietária foi assaltada e levaram meu cheque dentro da carteira guardado. Claro que aquela senhora, após ter feito o BO na Delegacia do bairro, avisou e me pediu para trocar o cheque, além de sustar o pagamento junto ao Banco Bradesco. Uma semana depois, recebi o aviso de que o mesmo havia sido encontrado amassado no caixa de uma agência qualquer. Tentaram resgatá-lo sem sucesso. De posse do mesmo, fui à residência da proprietária do apartamento conversar com ela. Só que todos estes movimentos de peças de xadrez contrários aos meus desejos, deixaram-me desanimada e sem motivação para continuar com o jogo. Queria desfazer o compromisso da viagem. A conversa entre mim e ela ficava cada vez mais tensa. Não conseguíamos nos entender. A última vez que vi meu filho de dois aninhos foi descendo as escadas atrás do irmão mais velho.

CINCO HORAS MAIS LONGAS DE MINHA VIDA

“Entrega o teu caminho ao Senhor; confia nele, e ele tudo fará”. Salmos 37:5

Ajustes acertados, despedidas tensas. Desço as escadas para ir embora. O sobrado ficava no fim de um morro de uma rua movimentadíssima, onde passavam vários ônibus, que partiam em direção ao centro da capital paulista, Osasco e somente um deles (Apenas UM!) para o Mercado Municipal de Pirituba, caminho de minha casa. Enquanto desço, meu filho de dez anos sobe sozinho... Pergunto assustada pelo irmãozinho de dois. A resposta chega rápida e certeira: “Não sei, ele ficou com você”. Não, ele havia descido as escadas minutos antes atrás do irmão mais velho. Desespero! As horas que transcorreram foram as mais terríveis de toda minha vida! A Rua Antonio Ayrosa, na Vila Jaguara, estava em reformas pela SABESP, canos imensos de esgoto, alinhados aos buracos enormes, à espera do término da obra, que se encontrava a meio caminho. Dirigia meu carro desesperadamente! Parava e a pé, procurava por meu filho, gritando o nome dele como louca insana. Meu único desejo era encontrá-lo dentro daqueles buracos antes que a tempestade chegasse. O céu estava tão escuro quanto o meu coração! 

O primeiro milagre aconteceu. A tempestade se dissipou, antes de cair em enxurrada sobre nós, mas meu tormento, após três horas de buscas, não terminou! Fui à Delegacia mais próxima fazer um BO. O delegado me antecipou algumas possibilidades. Afinal o sobrado tinha no portão um ponto de ônibus! Fui à Estação Santa Brígida, em busca de informações. Ninguém havia visto uma criança tão pequena naquele local. Ali deixei o número fixo de minha casa, e me lembrei de que se alguma notícia boa chegasse, eu não estaria lá para atender ao telefone. Voltei à Delegacia e deixei o número dos meus vizinhos. Ao mesmo tempo, que sem pudor nenhum, chorando convulsivamente, ajoelhei-me diante de uma imagem de Nossa Senhora Aparecida, ali, na sala de espera daquele lugar. Durante meu encontro íntimo com Ela, um pensamento veio à tona. Precisava avisar os meus vizinhos. Pedi para fazer a ligação. Deixaram. E a notícia me alegrou: “Venha para casa imediatamente, seu filhinho está aqui!”. Cheguei em casa louca de emoção. Enquanto o abraçava sem ainda acreditar no milagre que ocorrera, ouvia: “Onde você estava, mamãe? Por que você não me atendia?” Meu bebê tinha olhos fundos de cansaço, pezinhos com bolhas de tanto andar. Dormiu após o banho, sem nem mesmo querer se alimentar, além do meu leite materno, que insistia em não largar e que eu, maravilhada, lhe cedia! Só depois de cuidar dele é que soube que chegara num carro azul, com cinco rapazes, que jamais conheci. Nunca pude agradecer o que fizeram. Só sei que encontraram uma criança sozinha, atravessando a rua, que quase o atropelaram. Pararam e fizeram perguntas. Meu filho sabia dizer o nome de todos na família, dizia que a mamãe era professora de Inglês no colégio que subia a rua, e que virando tudo às esquerdinhas, chegava em casa. Pelo que ouvi dos vizinhos, pelo que me contou meu anjinho, um milagre aconteceu conosco. O Rodrigo entrou em um ônibus, atrás de pessoas, e dele saiu, atrás de outras pessoas, reconheceu onde estava e voltou a pé, sozinho, para casa. Entre dezenas de linhas de ônibus, meu filhinho entrou num único, que passava de hora em hora, que o levou para minha casa!

Liz Rabello (In INTERVALOS, Editora Beco dos Poetas, 2013)

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015




VERDE AMARELO  AZULADO E  UM BRASIL FELIZ!

Adorava ir aos domingos visitar minha irmã e ficava por longos minutos olhando para um casal de araras tentando imaginar o que conversavam . As cores verde, amarelo, azulado me faziam sonhar com meu povo sendo feliz assim pelo resto da vida.

Certa vez um ovinho, dois... Num lindo ninho que ele construiu para ela. Continuavam nos namoricos, o ninho ali, perdido, com dois ovinhos muito frios, que ela não fazia a mínima questão de esquentar. Ele zangou. Deu uma surra nela, estraçalhou o ninho e voou para outras bandas.

E daí se desfez o meu sonho de brasileiros felizes para sempre.


Liz Rabello



EU BUSCADOR DE MIM

Lembro-me de uma tarde, por volta de seis horas. Fazia frio, muito frio! No entanto, não o sentia, olhava para o céu que não tardaria a escurecer, já escondendo os raios do sol na linha perdida do horizonte. Pedia em oração que a luz levasse embora a tristeza que eu tinha e que trouxesse pela noite adentro saúde para meu pai.

“- Filha, faz tanto frio, vem pra cá, que eu quero te abraçar.” Era ele, sempre macio, carinhoso pai. O melhor de todos e dentro dos braços dele eu encontrava a paz e a alegria de viver. Desistia de buscar por mim.

Acordei na manhã seguinte com os berros de mamãe. Ela estava chorando muito na beira da cama, onde meu pai agonizava. Procurei por Deus, em oração. Perdidas palavras! Implorei ao divino, que me concedesse uma infância maior ao lado de papai. Minha oração não vingou. A morte o levou e eu fui com ela. Nunca mais parei de buscar por mim.

Liz Rabello

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015


NÓS DOS LAÇOS

Perdida no vazio das horas
Angústia de quem ama em vão
Cristais de sangue estilhaçados
rosas murchas em solidão!

Meu coração se fez em mil pedaços
E em cada corte se transmuta inteiro
porque você rasga os nós dos laços
costura estrelas, brilhas nos espaços!

Liz Rabello

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

MAGIA DE CORES 



Extasia-me o olhar
deixa-me inebriada
a candura da serra
as hortências azuis
mistura de ferro e trilhos
campos de flores
brincos de princesa
pássaros a beber seu mel
o passeio de Campos do Jordão
até Santo Antonio do Pinhal
é só luz... Magia de cores
a brincar com o verde dos penhascos

Liz Rabello





quarta-feira, 21 de janeiro de 2015



O “POBREMA “ É SABER SE É BARATO OU BARATA

Todas as previsões bombásticas estão se realizando. Em São Paulo, megametrópole urbana já é impossível viver: trânsito insuportável, calor maior do que 37 graus a qualquer hora do dia. As janelas não são mais fechadas à noite e sim de dia, para que o sol escaldante não derreta travesseiros de penas de gansos. Chuvas torrenciais de fim de tarde chegam com ventos e pedrinhas de gelo, que se derretem no asfalto secando em minutos e formando uma nova serração na metrópole: a evaporação instantânea.

Sombrinhas são usadas dentro do ônibus para nos livrar do sol que queima demais. E o pior é que mesmo as baratas, estes bichinhos que têm vida até após a bomba nuclear, não estão suportando. Saem dos esconderijos a procura de ar fresco e desandam pelos pés dos usuários de ônibus aturdidos e enlouquecidos duplamente por duas catástrofes ou três: sede, calor e repulsa!  Mas o bom humor dos paulistas não se deixa levar pela armadilha do tempo, e um homem simples grita do fundo do ônibus inundado de baratas: “O pobrema é saber se é barato ou barata”...


Liz Rabello

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015


PARA REDUZIR ENCHENTES QUEBRE O CINZA DE SEU QUINTAL
 E SUBSTITUA POR ÁREAS VERDES


Gramado dá trabalho, mas deixa um ar rural mais aconchegante. Plantei várias primaveras e um pé de jabuticaba. O calor fica bem menor e o cheirinho agradável de terra molhada não tem preço.



domingo, 4 de janeiro de 2015

CHUVA, CHUVINHA... VENHA MINHA LINDA E NÃO SE APRESSE A IR EMBORA... PODE FICAR! 

O dia amanheceu assim... Muita chuva, paz, beleza... Tudo o que a gente precisa para viver de bem com a natureza...







sexta-feira, 2 de janeiro de 2015


DOIS É UM

Dois caminhos a escolher
Ambos perfeitos
Endereço certo: Deus!
Princípio e fim de todas as coisas
Deus é a vida em ebulição
É só olhar a volta
Sentir e ver a presença dele
Em todo canto        
Vida eterna
Ciência e fé a proclamam
Continuidade infinita
Nada é efêmero em sua essência
Só eu e você
Que passamos!

Liz Rabello




DURMO EM CENA
Nas páginas de um livro
Adormeço palavras canduras
Travesseiro de penas de gansos
Esvoaçantes sonhos de algodão
Transpiro luz de estrelas
Jardins encantados
Para novo amanhecer ao fechar o livro

Nas páginas de um livro
Acordo sonhos gemidos
Colchas de retalhos
Mosaicos coloridos
Transmuto trovões e relâmpagos
Em clarões de estrela d’alva
Para novos incêndios de paixões ao fechar o livro

Nas páginas de um livro
Moram fantasias e delírios
Experiências de outros sentidos
Janelas abertas de outras almas
Transplanto energias de outras eras
Outonos em florescer de primaveras
Para semear novas colheitas ao fechar o livro

Liz Rabello


GRITOS
Vibra dentro de nós gritos de louvor
Vêm de lá do fundo de nossas emoções
Trazem a luta de sobrevivência de nações
Tateiam a paz que buscam em tormentos de dores
Guerreiros do amanhecer e da partida
Das terras poluídas e perdidas
dos muitos que se foram sem ter a justiça garantida.
É na música ancestral, gritos de pautas marcadas
pela chuva, pela paz, pela cantiga
pelo desejo de manter a própria cor!

Liz Rabello


CARTA DO CHEFE INDÍGENA SEATLE

O grande chefe de Washington mandou dizer que desejava comprar a nossa terra, o grande chefe assegurou-nos também de sua amizade e benevolência. Isto é gentil de sua parte, pois sabemos que ele não precisa de nossa amizade.

Vamos, porém, pensar em sua oferta, pois sabemos que se não o fizermos, o homem branco virá com armas e tomará nossa terra. O grande chefe de Washington pode confiar no que o Chefe Seattle diz com a mesma certeza com que nossos irmãos brancos podem confiar na alteração das estações do ano. Minhas palavras são como as estrelas que nunca empalidecem.

Como podes comprar ou vender o céu, o calor da terra? Tal idéia nos é estranha. Se não somos donos da pureza do ar ou do resplendor da água, como então podes comprá-los? Cada torrão desta terra é sagrado para meu povo, cada folha reluzente de pinheiro, cada praia arenosa, cada véu de neblina na floresta escura, cada clareira e inseto a zumbir são sagrados nas tradições e na consciência do meu povo. A seiva que circula nas árvores carrega consigo as recordações do homem vermelho.

O homem branco esquece a sua terra natal, quando - depois de morto - vai vagar por entre as estrelas. Os nossos mortos nunca esquecem esta formosa terra, pois ela é a mãe do homem vermelho. Somos parte da terra e ela é parte de nós. As flores perfumadas são nossas irmãs; o cervo, o cavalo, a grande águia - são nossos irmãos. As cristas rochosas, os sumos da campina, o calor que emana do corpo de um mustang, e o homem - todos pertencem à mesma família.

Portanto, quando o grande chefe de Washington manda dizer que deseja comprar nossa terra, ele exige muito de nós. O grande chefe manda dizer que irá reservar para nós um lugar em que possamos viver confortavelmente. Ele será nosso pai e nós seremos seus filhos. Portanto, vamos considerar a tua oferta de comprar nossa terra. Mas não vai ser fácil, porque esta terra é para nós sagrada.

Esta água brilhante que corre nos rios e regatos não é apenas água, mas sim o sangue de nossos ancestrais. Se te vendermos a terra, terás de te lembrar que ela é sagrada e terás de ensinar a teus filhos que é sagrada e que cada reflexo espectral na água límpida dos lagos conta os eventos e as recordações da vida de meu povo. O rumorejar d'água é a voz do pai de meu pai. Os rios são nossos irmãos, eles apagam nossa sede. Os rios transportam nossas canoas e alimentam nossos filhos. Se te vendermos nossa terra, terás de te lembrar e ensinar a teus filhos que os rios são irmãos nossos e teus, e terás de dispensar aos rios a afabilidade que darias a um irmão.

Sabemos que o homem branco não compreende o nosso modo de viver. Para ele um lote de terra é igual a outro, porque ele é um forasteiro que chega na calada da noite e tira da terra tudo o que necessita. A terra não é sua irmã, mas sim sua inimiga, e depois de a conquistar, ele vai embora, deixa para trás os túmulos de seus antepassados, e nem se importa. Arrebata a terra das mãos de seus filhos e não se importa. Ficam esquecidos a sepultura de seu pai e o direito de seus filhos à herança. Ele trata sua mãe - a terra - e seu irmão - o céu - como coisas que podem ser compradas, saqueadas, vendidas como ovelha ou miçanga cintilante. Sua voracidade arruinará a terra, deixando para trás apenas um deserto.

Não sei. Nossos modos diferem dos teus. A vista de tuas cidades causa tormento aos olhos do homem vermelho. Mas talvez isto seja assim por ser o homem vermelho um selvagem que de nada entende.

Não há sequer um lugar calmo nas cidades do homem branco. Não há lugar onde se possa ouvir o desabrochar da folhagem na primavera ou o tinir das assa de um inseto. Mas talvez assim seja por ser eu um selvagem que nada compreende; o barulho parece apenas insultar os ouvidos. E que vida é aquela se um homem não pode ouvir a voz solitária do curiango ou, de noite, a conversa dos sapos em volta de um brejo? Sou um homem vermelho e nada compreendo. O índio prefere o suave sussurro do vento a sobrevoar a superfície de uma lagoa e o cheiro do próprio vento, purificado por uma chuva do meio-dia, ou recendendo a pinheiro.

O ar é precioso para o homem vermelho, porque todas as criaturas respiram em comum - os animais, as árvores, o homem.

O homem branco parece não perceber o ar que respira. Como um moribundo em prolongada agonia, ele é insensível ao ar fétido. Mas se te vendermos nossa terra, terás de te lembrar que o ar é precioso para nós, que o ar reparte seu espírito com toda a vida que ele sustenta. O vento que deu ao nosso bisavô o seu primeiro sopro de vida, também recebe o seu último suspiro. E se te vendermos nossa terra, deverás mantê-la reservada, feita santuário, como um lugar em que o próprio homem branco possa ir saborear o vento, adoçado com a fragrância das flores campestres.

Assim pois, vamos considerar tua oferta para comprar nossa terra. Se decidirmos aceitar, farei uma condição: o homem branco deve tratar os animais desta terra como se fossem seus irmãos.

Sou um selvagem e desconheço que possa ser de outro jeito. Tenho visto milhares de bisões apodrecendo na pradaria, abandonados pelo homem branco que os abatia a tiros disparados do trem em movimento. Sou um selvagem e não compreendo como um fumegante cavalo de ferro possa ser mais importante do que o bisão que (nós - os índios) matamos apenas para o sustento de nossa vida.

O que é o homem sem os animais? Se todos os animais acabassem, o homem morreria de uma grande solidão de espírito. Porque tudo quanto acontece aos animais, logo acontece ao homem. Tudo está relacionado entre si.

Deves ensinar a teus filhos que o chão debaixo de seus pés são as cinzas de nossos antepassados; para que tenham respeito ao país, conta a teus filhos que a riqueza da terra são as vidas da parentela nossa. Ensina a teus filhos o que temos ensinado aos nossos: que a terra é nossa mãe. Tudo quanto fere a terra - fere os filhos da terra. Se os homens cospem no chão, cospem sobre eles próprios.

De uma coisa sabemos. A terra não pertence ao homem: é o homem que pertence à terra, disso temos certeza. Todas as coisas estão interligadas, como o sangue que une uma família. Tudo está relacionado entre si. Tudo quanto agride a terra, agride os filhos da terra. Não foi o homem quem teceu a trama da vida: ele é meramente um fio da mesma. Tudo o que ele fizer à trama, a si próprio fará.

Os nossos filhos viram seus pais humilhados na derrota. Os nossos guerreiros sucumbem sob o peso da vergonha. E depois da derrota passam o tempo em ócio, envenenando seu corpo com alimentos adocicados e bebidas ardentes. Não tem grande importância onde passaremos os nossos últimos dias - eles não são muitos. Mais algumas horas, mesmos uns invernos, e nenhum dos filhos das grandes tribos que viveram nesta terra ou que têm vagueado em pequenos bandos pelos bosques, sobrará, para chorar sobre os túmulos de um povo que um dia foi tão poderoso e cheio de confiança como o nosso.

Nem o homem branco, cujo Deus com ele passeia e conversa como amigo para amigo, pode ser isento do destino comum. Poderíamos ser irmãos, apesar de tudo. Vamos ver, de uma coisa sabemos que o homem branco venha, talvez, um dia descobrir: nosso Deus é o mesmo Deus. Talvez julgues, agora, que o podes possuir do mesmo jeito como desejas possuir nossa terra; mas não podes. Ele é Deus da humanidade inteira e é igual sua piedade para com o homem vermelho e o homem branco. Esta terra é querida por ele, e causar dano à terra é cumular de desprezo o seu criador. Os brancos também vão acabar; talvez mais cedo do que todas as outras raças. Continuas poluindo a tua cama e hás de morrer uma noite, sufocado em teus próprios desejos.

Porém, ao perecerem, vocês brilharão com fulgor, abrasados, pela força de Deus que os trouxe a este país e, por algum desígnio especial, lhes deu o domínio sobre esta terra e sobre o homem vermelho. Esse destino é para nós um mistério, pois não podemos imaginar como será, quando todos os bisões forem massacrados, os cavalos bravios domados, as brenhas das florestas carregadas de odor de muita gente e a vista das velhas colinas empanada por fios que falam. Onde ficará o emaranhado da mata? Terá acabado. Onde estará a águia? Irá acabar. Restará dar adeus à andorinha e à caça; será o fim da vida e o começo da luta para sobreviver.

Compreenderíamos, talvez, se conhecêssemos com que sonha o homem branco, se soubéssemos quais as esperanças que transmite a seus filhos nas longas noites de inverno, quais as visões do futuro que oferece às suas mentes para que possam formar desejos para o dia de amanhã. Somos, porém, selvagens. Os sonhos do homem branco são para nós ocultos, e por serem ocultos, temos de escolher nosso próprio caminho. Se consentirmos, será para garantir as reservas que nos prometestes. Lá, talvez, possamos viver o nossos últimos dias conforme desejamos. Depois que o último homem vermelho tiver partido e a sua lembrança não passar da sombra de uma nuvem a pairar acima das pradarias, a alma do meu povo continuará vivendo nestas floresta e praias, porque nós a amamos como ama um recém-nascido o bater do coração de sua mãe.

Se te vendermos a nossa terra, ama-a como nós a amávamos. Preteje-a como nós a protegíamos. Nunca esqueças de como era esta terra quando dela tomaste posse: E com toda a tua força o teu poder e todo o teu coração - conserva-a para teus filhos e ama-a como Deus nos ama a todos. De uma coisa sabemos: o nosso Deus é o mesmo Deus, esta terra é por ele amada. Nem mesmo o homem branco pode evitar o nosso destino comum."


segunda-feira, 29 de dezembro de 2014


AQUI É BARATO!

Muitos são os meios que as pessoas usam para vender seus produtos ou fazerem propagandas de serviços prestados. Mas este foi inusitado. Diariamente saía da escola que trabalhava, atravessava a rua e me deparava com um papagaio. Simpático. Agradável e muito conversador. Parava, tocava em seus pezinhos e fazia carinhos nas pontas das unhas afiadas. Perguntava o nome e dizia o meu, que jamais aprendeu.  Seguiam-me os alunos da primeira série. Era uma festa na porta do mini bar, restaurante, pastelaria que ali se escondia...

Certa vez ele gritou ofegante nos surpreendendo: “AQUI É BARATO!”... Rimos muito e passamos a retrucar... “BARATO NADA... AÍ É CARO!

O esperto então nos surpreendeu com uma fúria sem igual: “BARATO, BARATO, BARATO!” Dando fim ao papo.

Liz Rabello